Por Rubens Gama
Pode parecer estranho, mas igrejas também podem ser enquadradas como empresas de radiodifusão, quando sua estrutura assim o determina.
Interessante decisão do Tribunal Superior do Trabalho declarou que igrejas, quando organizam atividades de radiodifusão, para os fins do enquadramento da atividade de jornalistas, podem ser enquadradas como empresas de radiodifusão.
O Tribunal Regional da Segunda Região havia afastado a caracterização de contrato de radialista, sob o argumento de que a igreja, ao se utilizar de mecanismos próprios de radiodifusão, o faz apenas para propagar o evangelho, sendo a estrutura um meio para aquele, fim, que seria preponderante para o enquadramento jurídico do contrato de trabalho.
Ao reformar a decisão, a 3ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho, com relatoria do Ministro Maurício Godinho Delgado, declarou justamente o oposto:
No caso concreto, verifica-se dos elementos fáticos constantes do acórdão regional, aliada à afirmação efetivada pela própria Reclamada que, muito embora seja uma instituição religiosa, cuja finalidade principal é a pregação do Evangelho, também resulta incontroversa sua atuação como entidade de radiodifusão, mediante a produção profissional e habitual de programa da igreja para transmissão em rádio, pela qual atinge uma de suas atividades precípuas de propagar sua doutrina religiosa. A propósito, é cada vez mais comum, na complexa e multifacetada sociedade contemporânea, a reunião de múltiplas atividades organizacionais na estrutura de uma entidade ou organização originalmente singela e unidimensional. É o que se percebe, por exemplo, em entidades universitárias mais sofisticadas, bem como em entidades religiosas mais bem arquitetadas. Diante do exposto, tem-se que o TRT, ao concluir que a Reclamada não atua no segmento de radiodifusão, violou o art. 3º da Lei 6.615/1978. PROCESSO Nº TST-RR-2172-37.2015.5.02.0056. Publicado em 25/9/2020
O Tribunal aplicou o art. 3º da Lei 6533/1078, que regulamenta atividade de radialistas e que diz, no seu caput:
“Considera-se empresa de radiodifusão, para os efeitos desta Lei, aquela que explora serviços de transmissão de programas de mensagens, destinada a ser recebida livre e gratuitamente pelo público em geral, compreendendo a radiodifusão sonora (rádio) e radiodifusão de sons e imagens (televisão).”
Embora existam situações no Direito em que a Igreja goza de privilégios, neste caso prevaleceu o tratamento equânime entre atividades religiosas e seculares, com leitura bastante direta do texto legal, que não fez distinções que dependessem do conteúdo veiculado.
Trata-se, como se vê, de uma decisão interessante, que de uma só vez implica debate sobre interpretação jurídica, proteção da atividade profissional, proteção da atividade de radialista e, para quem quiser ver assim, princípio da laicidade do Estado (embora não seja saber se o legislador da época chegou a decidir com este critério).